sexta-feira, 7 de abril de 2017

Reflexos cromados

Reflexos cromados

O que aconteceu?
Um dia fui um dos mais desejados;
Quando era novo, meus cromados brilhavam, minha pintura era reluzente, eu tinha um perfume exuberante;
Conheci meu proprietário em 1958, quando ele foi me buscar na loja, ainda novinho;
Quando chegamos em casa, ele me mostrou com orgulho para sua esposa, parentes e vizinhos;
Todos comentavam sobre minha beleza, minhas curvas, meu conforto, meu tamanho, entre tantos outros elogios;
Compartilhamos de várias alegrias, como quando fomos buscar sua esposa e sua filha recém-nascida no hospital;
Ele estava radiante e eu mais ainda por ter a honra de trazê-las;
 Íamos aos piqueniques e passeios de domingos e eu sempre tocava no rádio várias canções para animar essas tardes;
Alegrias que aos poucos, com o passar dos anos, foram sendo interrompidas;
Fui ficando velho, desgastado, já não tinha mais o mesmo brilho, a mesma potência, a mesma beleza anterior;
Até que um dia fui substituído por outro e deixado de lado, esquecido num canto qualquer;
Fui oxidando, quebrando algumas partes, perdendo outras, vazando fluídos;
Minhas luzes há tempos se queimaram e já não tocava mais no rádio as lindas canções de outrora;
A meiga e doce menina que vi nascer, crescer e aprender a dirigir comigo, era a primeira a me rejeitar;
Dizia que eu era feio, ultrapassado e que só atrapalhava. Às vezes ela me batia, jogava objetos em cima de mim;
Certo dia apareceu um senhor com um guincho aqui em casa e me arrastou para um campo junto de vários que assim como eu se tornaram velhos, obsoletos e rejeitados;
Aos poucos presenciava os que estavam ao meu lado sendo levados;
Aos poucos eu ia sendo sucateado, meus frisos e adornos eram quebrados, arrancados e roubados, meus vidros foram trincados e os faróis e lanternas quebradas;
Já estava todo amassado, não tinha mais cor, apenas ferrugem;
Hoje me encontro nessa planície, em meio ao mato, deixado sobre o escaldante sol diário e a baixa temperatura, na escuridão solitária da noite;
Ainda me lembro daqueles há quem um dia dei tanta alegria e com quem tive muita alegria também;
Agora só me resta esperar o dia em que a impiedosa oxidação fará seu trabalho e terminará com tudo;
Isso só me faz lembrar que um dia seremos apenas uma foto na estante de alguém, depois, nem isso.


O Lobisomem.
















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